Mundo Paralelo
Num mundo paralelo, há um governo quase oculto, formado só por tias e avós. Elas descumprem todas as regras impostas pelas mães e todo mundo pode comer doce, bala e chocolate antes das refeições; se aprende a falar palavrão desde cedo e o bacon não faz mal.As rádios só tocam Mercury Rev e Guillemots, os Flaming Lips lançam um disco novo por semana. E a cada nova audição, você divinamente se aproxima mais do céu, da iluminação e do pleno entendimento das causas humanas.
A televisão só reprisa Anos Incríveis, Castelo Rá-tim-bum, Chaves, e no cinema todo dia é reestreia de toda a saga Star Wars e Senhor dos Anéis.
Machado de Assis, Fernando Pessoa, Neruda, Drummond, Mark Twain e Lewis Carroll são realmente imortais e tomam café da manhã todos os dias com as pessoas, então ninguém nunca mais precisa ler o jornal. Saber as notícias do mundo pela voz dos escritores é como ter a poesia dentro de si. O mundo real ganha cor e fantasia.
Ninguém tem ciúmes do Orkut nem clica em e-mails cheios de vírus que prometem ajudar alguém bonzinho; todos os e-mails contendo spam do mundo todo são misteriosamente redirecionados para todas as pessoas cujo sobrenome é Sarney.
Conhecer pessoas é mais fácil do que nunca pois ninguém tem motivos para ser mesquinho, para não ser honesto ou verdadeiro.
Os quadrinhos do Laerte ilustram outdoors e ninguém interrompe o seu almoço com telefonemas desimportantes de trabalho.
As religiões não cobram dízimo e a cada ser vivo é dado o direito irrefutável de acreditar no que quiser. Viajar em turma é bem mais fácil e discutir é prazeroso, pois ninguém leva nada para o lado pessoal. Buda, Alá, Deus, Maomé, Jesus Cristo, Thor, Galactus e o Ultraman estão todos numa mesa de bar, bebendo hidromel e aquavit enquanto caçoam daqueles tempos em que os humanos destruíam prédios em nome das religiões.
Num mundo paralelo é obrigatório ter um hobby, um lazer e um passa-tempo, e de tempos em tempos é permitido abandoná-los todos sem culpa, engavetar os projetos e nada fazer.
Aos animais, é dada a honra máxima que pode ser adquirida num planeta como a Terra: o direito de andar livremente entre os mortais, sem medo de serem feridos ou maltratados, pois afinal de contas isso aqui sempre foi, acima de tudo, deles.
E ninguém tem medo de ser feliz ou de contar isso para todos, porque ter medo da inveja alheia já é coisa do passado.